Concurso da Fundação Calouste Gulbenkian - "Darwin regressa às Galápagos"

Os alunos do 11º ano da nossa escola realizaram alguns trabalhos para o concurso em epígrafe, os quais passamos a reproduzir. Não obstante a boa qualidade de todos os textos, chamamos a atenção, em particular, para a originalidade e riqueza literária e vocabular do texto da professora Rita Meireles que a seguir reproduzimos. Parabéns a todos.

«Cada vida é um céu estrelado de outras vidas!... Na viagem da nossa vida entrelaçam-se alguns milhares de pequenas vidas… Profissionalmente, cerca de uma centena, ano após ano, invade-nos sorrateiramente, impõem as suas impressões digitais inconscientemente na nossa vida e ausentam-se… Este afastamento perturbante é amargurado pela saudade, que o tempo apaziguará com novos ingressos. Muito poucos estudantes remanescem para sempre nesta jornada. Escassamente, alguns sorriem e reconhecem as engelhas com que as páginas do tempo nos presenteiam, quando os nossos caminhos se voltam a cruzar. Como é gratificante quando este reencontro acontece e escutamos o nosso nome acompanhado de palavras circunstanciais, simpáticas, carinhosas, reconhecidas…Da rotina do início de um novo ano faz parte integrante o nervoso miudinho, o friozinho no estômago apertado do primeiro encontro, do primeiro impacto, do primeiro julgamento sumário.
Chegam até nós, pequenas plântulas resultantes da germinação de minúsculas sementes delicadas de espécimes raros a proteger e preservar. Transformar-se-ão em árvores de grande porte se o nosso desejo se cumprir. A nós cabe-nos acompanhar este difícil processo de transformação. Dos primórdios foliares esperamos ver brotar ramos robustos e imponentes. Tentamos auxiliar, minimizar, simplificar a complexidade, a violência das modificações. Vamos podando os tenros raminhos, enxertando variedades mais resistentes, regando cuidadosamente para não afectar a parte aérea, conduzindo a água e sais minerais às suas sequiosas raízes. Estes ingredientes, água e minerais, cumulativamente com a luz e o oxigénio serão transformados na sua própria matéria, no seu próprio ser.
Não podemos chamar a nós a total responsabilidade do sucesso do processo. A absorção, captação, assimilação dos elementos está inteiramente a seu cargo, dependente da sua vontade e fora do nosso alcance.
Lenta e progressivamente, é necessário retirar a campânula protectora e isoladora que os envolve, quando se abeiram de nós. É forçoso permitir as agressões do meio externo. Esforçamo-nos por as amenizar mas, temos que cumprir o programado… Estudamos, pesquisamos, investigamos, experimentamos de modo a serenar as mudanças…
Após a climatização, outra nova etapa se impõe: abandonar o meio artificial e nutritivo onde se encontram as suas delicadas raízes, e cobri-las com húmus antes de terminarmos com um solo mais arenoso, que obriga as raízes a afundarem-se e resistirem ao impacto físico destas novas condições, tantas vezes adversas e hostis.
Continuamos a nossa missão: podando para fortificar, regando para crescer e afastando todas as vicissitudes que poderão pôr em causa o futuro das nossas árvores.
Tentamos criar guias fortes para os seus ramos e conduzi-los o mais rápida e eficazmente em direcção à luz, afastando-os das trevas o máximo permitido. Não omitimos as trevas, é fulcral mostrar que existem e ter contacto com elas para que se aprecie verdadeiramente a luz e se conheçam as suas potencialidades. Pretendemos que se adaptem ao ambiente, criando condições para a aquisição e desenvolvimento de conhecimentos, valores fundamentais e atitudes favoráveis a esta integração.
Partilhamos responsabilidade com as gerações futuras. Compete-nos prepará-los para a sua vida adulta, facultando-lhes mais-valias para a sua sobrevivência num planeta em constante evolução.
Devemos manter um sistema aberto à imprevisibilidade e às permanentes mutações socioculturais e económicas que nascem da massificação do mundo dito moderno. Não nos limitamos a uma comunicação unilateral, temos um papel activo, criativo, motivador e estimulante, implementando um ambiente de cooperação em que juntos temos participação efectiva. Preocupa-nos a promoção da autonomia na resolução de problemas, no levantamento de hipóteses, na investigação… Confrontamos os alunos face a questões que envolvam experimentação, suscitando a curiosidade, o interesse e motivando o seu envolvimento. Devemos ser inovadores, dinâmicos, comunicativos, críticos, carismáticos, observadores, apresentar constantemente desafios, provocar a inspiração e exigir sempre mais e melhor. Com os nossos protegidos partilhamos êxitos, imperfeições e decepções.
Frustrantemente, a nossa intervenção não é tão determinante como ambicionámos e existe todo um património genético, todo um conjunto de variáveis influentes incontroláveis que, por mais que se guiem os ramos, se podem, se enxertem não conseguimos o pretendido. As folhas amarelecem, as flores rareiam, os frutos são raros e os ramos franzinos. Não desistimos, persistimos na nossa luta, voltamos a estudar novos métodos, novos instrumentos, actualizamos conhecimentos, modificamos e corrigimos actuações, buscando sempre o fortalecimento da nossa arvorezinha.
A nossa realização passa por vermos as nossas plantinhas, a quem nos dedicamos muitas vezes mais que aos nossos entes, autonomamente capazes de florescer e frutificar.»
Posted on 2/17/2009 01:14:00 da tarde by D.on Eg@s and filed under | 0 Comments »

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